quinta-feira, abril 10, 2008

Whatí?!?


Um transexual. Um gajo que já foi gaja. Que decidiu manter a sua função reprodutora apesar de fazer uma mastectomia e de se encher de injecções de testosterona para lhe dar o ar másculo que a cabeça exigia. Está grávido. A mim, que me considero uma moça bastante liberal, isto parece-me muito à frente. Demasiado à frente. Para lá de bizarro.
Parece que o bebé é uma menina. Ou seja, uma mulher que recusou o seu género e transformou-se em homem, só consegue gerar vida no feminino. A vida é tramadamente irónica. Ou não.

quarta-feira, abril 09, 2008


Humberto Borges ©

Por enquanto, a Mariazinha, com os seus 6 anos, era uma criança igual às outras. Com os seus cabelos aos caracóis loiros, tapados pelo chapéu de algodãozinho fino e com a sua pele tão branca como a areia, era uma criança como as outras, a fazer castelos de areia à beira mar, à medida que as ondas do mar os destruíam. Havia quem dissesse que já se encontrava na Mariazinha grande autodeterminação, espírito empreendedor e muita força de vontade. Um monte de disparates ditos por adultos que teimam em ver as crianças à sua imagem e esquecerem-se do que é ser criança. Certo, certo é que a Mariazinha agora era apenas uma criança igual a todas as outras, que chorava, ria, brincava e amuava e a quem a vida se lhe oferecia inocente e cheia de uma infinidade de possibilidades. O que seria a Mariazinha quando crescesse ainda ninguém sabia. E muito menos o saberia ela. Viria a ser viajante, correr o mundo por entre o frio dos Andes e o calor dos trópicos ou seria antes uma perfeita dondoca, coquete e cuidada, perdida entre roupagens, adereços e perfumes, preocupações únicas da sua existência? Seria voluntariosa, altruísta e abnegada ajudando quem necessitasse ou uma perfeita bandida a assaltar bancos ao bom estilo dos anos 30? Seria ceifeira em plena seara alentejana ou partiria para longe, para Africa, para grandes caçadas savana fora? Casaria de véu e grinalda, seria mãe dedicada, mulher fiel e profissional esmerada ou enveredaria por uma carreira de espectáculos de rua? Seria tropa ao serviço da nação ou padeira ao serviço de fomes alheias? Seria amorfa, sem qualquer característica que a distinguisse dos demais ou seria tão peculiar que nunca encaixaria neste mundo?
O que a Mariazinha seria um dia, ninguém sabia. Porque as possibilidades que a vida lhe oferecia eram tantas como os castelos que agora construía despreocupadamente à beira mar. Por isso, deixai a Mariazinha ser uma criança igual à outras, com o seu chapéuzinho de algodão, sem preocupações com o que a vida lhe trará.

sexta-feira, abril 04, 2008

Pois...


Humberto Borges ©

Mas que queremos da vida? É a vida? O que se procura em cada segundo para se perder em cada segundo? O tempo, assim, de nada nos serve. Um dia, dando por nós próprios, perguntamo-nos o que fizemos, por onde andámos, que cidades e casas percorremos, sem que uma resposta nos satisfaça. A vida, então, limita-se a ser o que fez de nós, sem que o tenhamos desejado, e nada pode ser feito para voltar atás, nem para restituir os passos trocados de direcção, as frases evitadas no último extremo, o olhar que se desviou quando não devia. Ah, sim - e o amor? É isso que queremos da vida? É verdade: cada um dos abraços que se deram, contando cada instante; o rosto lembrado no auge do prazer, quando um súbito sol desponta dos seus lábios; os cabelos presos nas mãos, como se elas prendessem o feixe da eternidade... Assim, a vida poderá ter valido a pena. É o que fica: o que nos foi dado e o que damos, sem que nada nos obrigasse a dar ou a receber, o puro gesto do acaso na mais absoluta das obrigações. Então, volto a perguntar: que outra coisa queremos da vida?

Nuno Júdice