quarta-feira, março 26, 2008

Gaijos que não me importava de ter a passearem-se cá por casa


Javier Bardem
Obviamente que sem aquele penteado parolo do This is no country for old men mais a bazuca e o ar alucinado.

segunda-feira, março 24, 2008

Um breve conto neste pós Páscoa


Humberto Borges ©

Uma garrafa de whisky, se faz favor, disse Carlos para a solicita caixa do supermercado AC Santos do bairro, mantendo-se imóvel a fitar o inexistente.
Deus, se por acaso existisse como lhe diziam, tinha-lhe roubado a vista assim que germinara no utero materno. Talvez por isso mesmo nunca acreditou que existisse uma entidade que diziam ser de bondade infinita que tivesse escolhido logo a ele, uma criança ainda sem experiência alguma em pecados, para o privar assim da visão. Pensava sempre que, caso existisse, Deus estaria certamente a curar uma imensa ressaca no dia em que nascera. Se nele havia pecado teria sido precisamente adquirido depois, há medida que crescera e que se apercebera da importância do que não tinha. Quando a inveja o começou a roer, por dentro e por fora. Inveja daqueles que viam e que lhe tentavam descrever um mundo que ele desconhecia, que nem sequer conseguia imaginar como fosse. As pessoas podiam dizer-lhe que uma casa desenhada por uma criança era quadrada, que o sol que o aquecia nos fins de tarde encostado ao banco de jardim, envolto em divagações ébrias, era amarelo ou que a bola de futebol que fazia vibrar multidões era redonda. Para ele podiam ser como quisessem porque o cérebro pura e simplesmente não lhe devolvia uma imagem daquilo que não conseguia ver. Certamente que aquele corpo frágil e engelhado se enchera de pecado cada vez que odiara a mãe e a desejara calar para sempre quando esta lhe repetira que tivesse paciência, que se tinha de conformar porque se não via o mundo que Deus tinha criado era porque tal tinha sido a vontade desse mesmo Deus. Que incongruência! Criar uma obra destas e depois privar alguns de a verem.
Sim, agora era um homem cheio de pecado. Que mais se lembraria Deus de lhe tirar, pensava amiúde.
De que marca? perguntou-lhe aquela voz familiar. Qualquer uma, respondeu Carlos, enquanto o resto da frase lhe morria na boca e lhe pairava no pensamento. Porque a verdade é que qualquer marca lhe servia para apagar da memória as imagens que nunca tinha tido.

sábado, março 15, 2008

Pois...


Humberto Borges ©

o maior segredo por Fernanda Câncio

Há muitos segredos que não se contam às crianças. Os do sexo, desde logo – geralmente esperamos até ser tarde de mais e não haver nada para revelar – e os outros todos que mesmo que contássemos elas não perceberiam. O mais segredo de todos, tão misterioso que até o é para nós, é o da diferença entre as crianças e os adultos. E o segredo, naturalmente, é que não há diferença. Nenhuma.Calma: não estou para aqui a fazer a apologia de actividade criminosas. Falo da ideia que as crianças têm dos adultos. De como quando se é adulto se sabe sempre o que fazer e de que forma, a diferença entre o bem e o mal, o sítio onde virar para ir dar ao sítio certo. De como se é sério e compenetrado e responsável, de como nunca se fazem palermices ou coisas potencialmente perigosas só para ver como é e ao que sabe. De como não se tem medo do escuro nem de estar só, de como não se chora quando um brinquedo ou um objecto de que se gosta muito se parte ou não nos é oferecido no Natal e de como não se anda à bulha por causa de um nome feio ou de uma pirraça.Enfim. Era assim que a maioria de nós, adultos – se não todos – via os adultos quando não o éramos e nos imaginávamos quando o fôssemos. Acreditávamos que todas as dúvidas e perplexidades se desvaneceriam. Que seríamos outros, completamente outros, a rimar com as caras compridas e as rugas e os cabelos brancos e aquela preocupação toda com coisas tão desinteressantes como empregos e contas. Antecipávamos uma espécie de unidimensionalidade, uma simplificação da vida que, em crianças, nos parecia tão enigmática e inexpugnável.Descobrimos exactamente o inverso. Que tudo se complica, que tudo surge cada vez mais indecifrável, que não fazemos ideia nenhuma de para onde ir e como, que nada é previsível nem óbvio. Que temos de inventar o caminho à medida que avançamos e que não há mapas nem tabuletas nem sequer sentidos proibidos. E que, seja o que for que façamos ou pensemos, por melhor que nos comportemos, não há recompensa garantida a não ser, talvez, a ideia que fazemos de nós próprios – sendo que a ideia que fazemos de nós nunca é grande coisa porque nos conhecemos bem demais. E que temos de aprender a disfarçar o pavor que tudo isso nos faz sentir – porque, afinal, somos adultos e espera-se de nós (até nós esperamos de nós) que saibamos o que andamos para aqui a fazer. Há panaceias para isto, claro. Sistemas organizados de sentido como as fés e as religiões, sejam de que género forem. Pertenças a comunidades que nos conduzem num articulado de regras e interditos. Compromissos a que nos amarramos para reduzir as opções. Normas e leis. Tabus. Palavras a que prestamos vassalagem e servidão. E causas, sejam imateriais ou pessoas, às quais nos devotamos. Crianças, por exemplo. Por elas é preciso ser forte e monolítico, capaz. Por elas é necessário colocar a máscara do adulto e alisar o mundo. Fazê-lo parecer um lugar unívoco, programável, antecipável. Fazer-nos parecer de confiança. Criar esta ilusão que cremos essencial e que talvez o seja – como saber? Como aferir? Criar a fonte desta angústia e perplexidade, criar e a um tempo ocultar este travo amargo que nos acompanha desde que descobrimos o segredo, este segredo – o de que nada sabemos e nada saberemos, que nada controlamos e nada podemos. Que, como escreveu Pessoa na pena de Ricardo Reis, tudo é tão pouco, o mais é nada – e é preciso calar.

In Sermões impossíveis da Notícias Magazine de 17 de Fevereiro e publicado aqui: http://5dias.net/2008/02/23/o-maior-segredo/

terça-feira, março 04, 2008

Uma delicia!


Ou como se pode ser extremamente maduro aos 16 anos. Mesmo parecendo que não.

domingo, março 02, 2008

Ódios de estimação



Não sou apreciadora de gelados por aí além. Nem sequer do Magnum em particular. É coisa sem a qual vivo bem, felizmente. Já me basta aquelas às quais tenho que resistir à tentação. Mas confesso que me irrita ver a Eva Longoria, podre de boa e trabalhada a bisturi, dizer-me que não consegue resistir ao Magnum, como se a própria dieta da moça fosse feita à base dos ditos. É aliás algo que me irrita na publicidade e que considero um insulto à minha (parca) inteligência: utilizarem gajas destas, que sabemos que à partida têm vivências inacessíveis à maioria da população, para nos venderem aquilo que sabemos que elas próprias não consomem. Um bocado no estilo da Penelope Cruz a dizer-nos que só usa tintas L’Oreal pró cabelo, para ter aquele tom acobreado e sem brancas. Já as estou a imaginar a encontrarem-se no supermercado da esquina lá de Hollywood, a encherem o carrinho de compras com gel de banho Dove e creme anticelulite da Nivea…