quinta-feira, abril 27, 2006

Da descartibilidade


Humberto Borges ©

Há umas semanas roubaram-me a mala em pleno Bairro Alto, exactamente no mesmo local, em menos de 10 meses. Podiam pensar que a Bolota é a gaija mais idiota deste planeta ao deixar-se roubar segunda vez no mesmo sítio. Enganam-se. Estava até bem atenta. Mas, bastaram 5 segundos de distracção e…zuca!! Lá se foi a mala (daquele género que nós mulheres cortejamos durante n tempo até ganhar coragem para as comprar e que nos despertam um sentimento de carinho e imprescindibilidade total) com telemóvel, chaves de casa e porta-moedas com dinheiro e cartões Multibanco. Tudo muito facilmente substituível, sem dúvida. Nada de grave, portanto, não fosse o trabalho e dinheiro dispendidos para substituir tudo.
No dia seguinte, já munida de novo aparelho, e enquanto navegava pelas novas funcionalidades da máquina, descubro a seguinte mensagem na secção Modelos para mensagens escritas (que são aquelas que já estão predefinidas para enviarmos quando não temos tempo para escrever uma, estilo Estou em reunião ou Agora estou ocupado ou Já te ligo): Também te amo. Assim. Tal e qual. Fantástico, não é? Até o amor que queremos expressar pelos outros já se encontra predefinido, luzidiamente empacotado em sms prontas a enviar.
Pergunto eu: se tudo se encontra orquestrado a favor da descartabilidade e volatilidade das relações, sejam elas de que tipo forem, onde substituímos pessoas com a mesma facilidade e rapidez com que substituímos objectos e os sentimentos até já se encontram formatados em sms, prontos a serem usados sem nos darem trabalhinho nenhum, como conseguiremos nós agir de forma contrária sem que isso nos cause uma imensa angústia e sensação de estarmos deslocados?

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