domingo, março 11, 2007


Humberto Borges ©

Margarida nascera com o cabelo todo laranja, a lembrar um fogo intenso. Os pais, que tanto tinham ansiado por aquela filha, olharam para ela acabadinha de nascer e pensaram que alguém, de pincel na mão, lhe desenhara aquela farta cabeleira encaracolada. Uma cabeleira de um laranja quente, que emoldurava um rosto miúdo e feliz, que não sabiam ainda sair à mãe ou ao pai. Inconsoláveis por aquela filha tão rara, levaram-na para casa e apresentaram-na às gentes da aldeia. Gente que invejava tudo o que não tinha. Principalmente se fosse coisa fora do vulgar. Houve quem prontamente dissesse que aquela criança só podia ser a encarnação do diabo, com aquela cabeleira que mais fazia lembrar as labaredas onde ardiam almas penadas e uivantes. Houve até quem dissesse que se ouviam gritos de dor vindos do meio dos cabelos de Margarida. Com o ódio que lhe viram dirigido, os pais de Margarida trataram de sair da aldeia que sempre haviam conhecido e procuraram melhores paragens. Escolheram uma casa isolada, no meio de um vale ao longo de um pequeno rio prateado e com terrenos de erva fresca e verdejante em redor. Ali o pai de Margarida punha as suas vacas a pastar e podia sempre ver por onde andava a filha dado o contraste que o cabelo laranja fazia com o verde dos prados. Margarida cresceu feliz da vida, com todo aquele espaço para si mais a sua cabeleira de um laranja cada vez mais vivo, que crescia abundantemente, quase na proporção da sua felicidade. Tanto que a mãe tinha que a aparar todos os dias, aproveitando os cabelos cor de fogo para fazer cabeleiras de Carnaval que vendia na feira da aldeia mais próxima, conseguindo assim uns dinheirinhos extra para a pequena familia.
No dia em que fez 12 anos, Margarida acordou com todo o seu cabelo caído na almofada. Assustada, espreitou-se ao espelho para logo perceber que pequenos cabelos igualmente fortes lhe despontavam na cabeça. Mas desta vez eram verdes. Não gostou nada daquilo. Preferia o seu cabelo da cor que era. Laranja, a combinar com todos os vestidos que a mãe lhe fizera. Foi chorona sentar-se na umbreira da porta, aquecida por um terno sol primaveril. Ao vê-la assim de lágrima no olho, o sol perguntou-lhe porque estava triste. Margarida explicou-lhe a razão de tanto desencanto, para o sol logo lhe responder que seria assim mesmo. Ao longo da sua vida o seu cabelo mudaria várias vezes de cor consoante os conhecimentos que fosse adquirindo. Até ficar branco cor de neve. Sinónimo de sabedoria intensa e tranquilidade.

1 comentário:

Anónimo disse...

he, he... eu gosto... laranja e verde. Já agora, que cor será a seguinte? que cor representará cada idade? talvez varie de pessoa para pessoa... algumas sempre laranjas outras nascem logo brancas?
Marsupas